Entendemos que desde há milhares de anos que o litoral não é estranho ao homem, a comprovar pela existência do Dólmen da Barrosa, monumento fúnebre localizado numa elevação suave nas proximidades do rio Âncora e não muito afastada do oceano.
Os habitantes destas paragens aproveitavam-se das condições naturais, das áreas mais férteis, para daí extraírem o seu sustento. E, com o tempo, começaram a utilizar em seu proveito a água, o vento, e o sol, bem como o que o mar lhes oferecia.
Com o tempo, os conhecimentos do homem vão-se ampliando, e já no século XIX, duas infraestruturas (o caminho de ferro e a estrada real) vieram atravessar Gontinhães e Santa Maria de Âncora, e foram essas as importantes alavancas que deram um grande impulso ao desenvolvimento das povoações ribeirinhas por onde passaram.
Pensamos que aí terá começado a grande transformação da orla costeira, entre as pedras de “Penedim”, em Âncora e o velho portinho de Gontinhães (actual Vila Praia de Âncora). É natural que a fixação do cordão dunar tenha começado pela plantação de vegetação própria para a contenção das areias, e pela florestação da área próxima.
Essa formação dunar terá implicado a deslocação do leito do rio mais para Norte, para a foz actual. Essa teria sido a extensão do cordão dunar mais exigente, pois aí a mesma foi robustecida com a aplicação da estacaria, da qual ainda hoje são visíveis alguns resquícios.
Entramos no século XX e, a meados do mesmo, era vulgar encontrarem-se sulipas, que eram utilizadas no reforço das dunas, e que eram removidas para brincadeiras de mergulho nos “Caldeirões”. Conta-se que algumas teriam sido aí aplicadas para se proteger esse cordão dunar depois de uma tentativa de reabertura da foz do rio Âncora por esse local, que teria sido contrariada pela CP. Nessa época era o meio mais eficaz de formação e “protecção artesanal dunar” em uso, com bons resultados e sem impactos significativos.
A orla costeira era, então, olhada com determinados objectivos, muito diferentes dos actuais, e em maior consonância com a protecção dos terrenos férteis e do meio a regenerar.
Na segunda metade do século XX começou a verdadeira acção predadora do homem.
A orla costeira arenosa portuguesa vinha sendo consolidada com a plantação de pinhais. O Pinhal da Gelfa foi classificado como Mata Nacional a partir de 1929.
Corria o ano de 1988 quando é elaborado pela CCRN o “ESTUDO DE ORDENAMENTO DO LITORAL DE CAMINHA”, onde já se referia o interesse das diversas fases de sucessão da cobertura vegetal do sistema “com vegetação pioneira, por vezes dispersa em tufos, mas com elevada capacidade de fixação radicular”, que permitia com as suas raízes, dar às faces das dunas uma maior estabilização das areias. Havia os agrupamentos vegetais de características endémicas que davam uma grande importância a estas áreas. Era vulgar verem-se as camarinhas, o rosmaninho, cardo, etc.
Dois anos depois (1990), a ondulação subiu a Duna dos Caldeirões, arrastando areias que bloquearam o leito do rio, e as águas ficaram estagnadas no sapal.
Considerando que um mal nunca vem só, no ano de 1991, a zona do cume dessa duna não afectada é terraplanada no período do verão, e aí se instala uma esplanada com dois quiosques.
O ano de 1994 foi positivo, pois o leito do rio é deslocado da base da duna para a zona do sapal mais a nascente, protegendo assim essa orla costeira dunar.
Há muitos anos que existia a necessidade premente de melhorar as condições do portinho, tendo-se desenvolvido nessa década de 90 o respectivo projecto. Assim, em finais do ano de 1999, numa reunião aberta, realizada na sede da Junta de Freguesia de Vila Praia de Âncora, cujo tema era a construção do novo portinho desta Vila, era exposto aos Ancorenses presentes, que os efeitos secundários dessa infraestrutura portuária iriam começar a fazer-se sentir no cordão dunar mais a Sul, junto às primeiras pedras designadas por “Penedim”, na freguesia de Âncora, e que, com o correr dos anos, essa influência se estenderia para Norte até à Duna dos Caldeirões em Vila Praia de Âncora. É o que temos vindo a sentir nestes últimos anos. Por isso, sofremos agora o que supostamente já era previsível.
Pensamos que haveria outras hipóteses de localização, com efeitos secundários bem mais reduzidos, mas as opções políticas nem sempre tem em atenção as necessidades reais das populações locais.
No início de Fevereiro deste ano, 2014, a Duna dos Caldeirões rompe e a ondulação invade o sapal e o rio com tal ímpeto, que ultrapassa a ponte do caminho de ferro, e o resultado é a definição duma outra foz, algumas centenas de metros a Sul da natural.
Corria o dia 17 de Fevereiro quando o responsável pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) se deslocou ao local, onde verificou que seria necessário desassorear o leito do rio, reforçar a margem junto ao campo de futebol e estudar a solução a implantar para a recuperação da Duna dos Caldeirões.
Nessa reunião, e no próprio local, o representante do NUCEARTES transmitiu-lhe que o que se podia fazer de imediato, e sem necessidade de projecto, era desassorear e redimensionar o leito do rio e mantê-lo a escoar as suas águas na sua foz natural.
O Senhor Ministro do Ambiente em 25-02-2014 visitou o local e terá tomado em consideração o ocorrido o que possivelmente deveria ser corrigido.
Ainda nesse mês de Fevereiro, e perante a falta de agilidade das entidades competentes, o assoreamento do curso normal do rio junto ao sapal ocorreu, e a sua foz natural junto à praia também, e a altura do areal subiu de uma forma nunca vista.
A reposição da circulação das águas do rio Âncora, através do seu leito e pela sua foz natural, só se iniciou no dia 22 de Maio e terminou em 4 de Junho, ou seja, 4 meses depois da ondulação ter passado a Duna dos Caldeirões.
A Duna dos Caldeirões, que inicialmente teria sido arrasada em cerca de 100 metros, na actualidade essa extensão já será superior a 200 metros. Questionamos se a intervenção programada, a começar em Setembro, se irá desenvolver num período de tempo suficiente para que o cordão dunar possa suportar ondulação superior à prevista, designadamente durante o próximo inverno.
Repetindo um título dum meio de comunicação de há 20 anos atrás, dizemos: vamos “SALVAR O LITORAL DA EROSÃO MARINHA… E DO HOMEM”.
ASSOCIAÇÕES
Liga para a Protecção da Natureza
ENTIDADES PÚBLICAS
Câmara Munic. Viana do Castelo
Dir. Geral Edif. e Monumentos Nacionais
Instituto da Conservação da Natureza
Instit. Port. Património Arquitectónico
INFORMAÇÃO
INTERESSANTE